Primeira parte do artigo escrito por Hélio dos Santos Pothin, músico, Doutor em Fisiologia Humana pela UFRGS e professor de Fisiologia Humana na Universidade Federal de Santa Maria, RS. Aproveite!
Música é a arte de
combinar os sons de um modo agradável ao ouvido. O som é uma forma de energia
que se propaga através de ondas de compressão e descompressão do ar. Quando
essas ondas chegam aos nossos ouvidos as células ciliadas do interior da cóclea
as transformam em impulsos elétricos. Esses impulsos são conduzidos pelos
nervos, por isso também são chamados impulsos nervosos.
As ondas produzidas por uma fonte sonora podem ter ou não
comprimento definido (freqüência determinada). Uma onda sonora com comprimento
definido é transformada, no ouvido, em impulsos nervosos os quais são
traduzidos pelo córtex (camada cinzenta mais externa do cérebro) auditivo como
um tom. A música melodiosa e harmoniosa é formada por tons que possuem altura e
duração fixas. Estas proporcionam ao cérebro condições de descobrir relações e
proporções entre si e, assim, ir compondo um edifício musical (Robert Jourdain. Música, Cérebro e Êxtase, Editora
Objetiva, Rio de Janeiro, 1998, p. 94).
Quando uma fonte sonora envia ondas sem comprimento definido
(freqüência indeterminada) nosso cérebro, indistintamente, traduz essa
informação como ruído (barulho). Este tipo de som é compreendido como uma
agressão e, por isso, nosso organismo se prepara para enfrentá-la na forma de
uma reação de estresse.[1] Os mecanismos
utilizados para isso são tão potentes que, fisiologicamente, são utilizados
durante uns poucos minutos apenas, caso contrário se tornam mais prejudiciais
do que benéficos ao nosso corpo.
Semelhantemente a qualquer situação de estresse, ocorre um
aumento marcante na liberação dos hormônios Cortisol e Adrenalina a fim de
preparar nosso corpo para a fuga ou para enfrentar a agressão (luta). Esses
hormônios liberam glicose dos locais de armazenamento, diminuem a utilização de
glicose nos tecidos fazendo com seu nível sanguíneo aumente; proporcionam maior
fluxo de sangue para os músculos; aumentam a pressão arterial, e deprimem o
sistema imunológico (diminuem a capacidade de combater doenças) (MuSICA Research Notes, vol. IV, edição
2, Outono de 1997: Norman M. Weinberger. The Musical
Hormone; R. A. Rhoades e G. A. Tanner, Fisiologia Médica, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2005). O
estresse é produto do hemisfério esquerdo do cérebro. Se esse lado for
predominante e se não soubermos vivenciar as situações de tensão, poderemos
ficar mais vulneráveis a problemas graves, como infarto ou derrame (Adriana
Toledo. Saúde é Vital, ed. Abril, SP, julho 2008, p. 80).
Portanto, para nosso sistema nervoso interpretar a melodia e
a harmonia da música as ondas sonoras que chegam ao sistema auditivo devem ser
tons, ou seja, ter comprimento definido (freqüência determinada). Existem
vários instrumentos que produzem tons: piano, flauta, violino, trompete,
clarinete, etc., mas outros instrumentos, porém, não produzem tons e sim ruído:
sinos, castanholas, chocalhos, pratos, vários tipos de tambores (caixa, bumbo,
pandeiros, bateria, etc.).[2] Por isso, o que
a maioria dos tambores faz é exatamente uma explosão de barulho (Robert
Jourdain. Música, Cérebro e Êxtase,
Editora Objetiva, Rio de Janeiro, 1998, p. 65).
Assim, instrumentos musicais que não produzem tons, mas
ruídos, aumentam os níveis dos hormônios do estresse nos ouvintes e, na relação
entre os três elementos musicais analisados, somente podem ser usados para
acentuar o ritmo, pois não produzem harmonia nem melodia.[3]
O volume ou intensidade do som igual ou acima de 90 decibéis
gera ondas sonoras fortes, produzindo vibrações que são sentidas através de
todo nosso corpo, na forma de impactos vibratórios e não apenas pelos ouvidos,
na forma de sons. As freqüências mais graves têm uma influência poderosa no
corpo e nas emoções (entrevista na Revista Vecko Revyn, No. 41, 1979, p.12). Quanto mais grave o som, maior o
comprimento e menor a freqüência da onda sonora e mais intensa é essa
influência. Portanto, sons nesta intensidade além de serem ouvidos são
literalmente “sentidos” pelo organismo. Estas vibrações afetam o funcionamento
dos órgãos internos e também estimulam a liberação dos hormônios do estresse (MuSICA Research Notes, vol. IV, edição
2, Outono de 1997: Norman M. Weinberger. The Musical
Hormone).
[1]
A reação de estresse, organizada pelo organismo, é
desencadeada sempre que um (qualquer) estímulo externo ou interno seja
compreendido como agressivo, ou seja, capaz de modificar o estado de constância
do meio interno do organismo (Homeostase) ou de lesar as células. Um som, mesmo
com freqüência determinada, mas com intensidade suficiente para lesar as
células ciliadas da cóclea, também será compreendido como agressivo e
desencadeará uma resposta de estresse. Um ruído faz com que a membrana basilar da
cóclea seja estimulada de forma desigual e desproporcional. Isto não é
considerado normal nem benéfico para o meio interno do organismo, por isso
desencadeará uma reação de estresse. A auto-preservação envolve vários sistemas
(nervoso, endócrino). O mecanismo mais rápido acionado é a reação ou resposta
de estresse. A resposta de alerta (faz parte da reação de estresse) visa à
auto-preservação e pode ser desencadeada por sons, pela visão, olfato e mesmo
tato, desde que o estímulo aplicado esteja gravado na memória como algo
perigoso ou que pode lesar células ou, ainda, provoque agressão a qualquer
célula do corpo. Um estímulo diferente do habitual que pode ser associado com
algo nocivo também desencadeia uma reação de alerta.
[2]
Embora existam sinos e tambores fabricados de maneira
que seu som tenha ondas com comprimento que pode ser considerado definido, a
maioria dos sinos comuns e tambores não produzem ondas sonoras com comprimentos
definidos. A Física considera que estes instrumentos produzem ondas sonoras não
tão definidas quantos outros instrumentos. Seria um som ainda “sujo” e,
portanto, não considerado junto com instrumentos capazes de, na maioria das
vezes, produzir sons bem definidos.
[3] Embora os instrumentos de percussão também possam ser
usados para criar efeitos sonoros, ao invés de ritmos, estamos analisando e
comparando, no contexto, os três elementos da música: harmonia, melodia e
ritmo. Assim, ruído estaria relacionado somente ao ritmo e não à melodia ou
harmonia. Além disso, mesmo efeitos sonoros, quando produzidos com ruídos,
aumentam os níveis de estresse.
Fonte: Música Sacra e Adoração