por: Daniel Azevedo
Meu contato com
a música reggae ocorreu no período em que atuei profissionalmente
como baixista. Os repertórios de música pop traziam canções de artistas de reggae mundialmente conhecidos como Bob
Marley, The Wailers, Ziggy Marley, Inner Circle, Jimmy Cliff e Peter Tosh. Noutros
projetos voltados à MPB, tocávamos músicas de Gilberto Gil, Chico César, Paralamas
do Sucesso, Cidade Negra, Tribo de Jah, Natiruts, O Rappa e outras, todas temperadas
com o ritmo jamaicano.
No reggae, há uma característica sonora marcante, evidente até mesmo para leigos: a repetição. Há um acento rítmico
executado pela guitarra, violão, teclado ou ukulele, que se repete por toda a música, pronunciando acordes somente no segundo e no quarto tempos
do compasso.
O contrabaixo
traz sempre uma equalização excessivamente grave, realizando linhas melódicas
pesadas e igualmente repetitivas. Nos shows de reggae, essas frequências graves são intensificadas
ainda mais pelo volume dos amplificadores, fazendo com que os
ouvintes literalmente “sintam” a música pelas vibrações das notas do contrabaixo.
Esse e outros elementos sonoros colaboram para a movimentação do corpo e para a
inibição da razão.
Há também muito misticismo
implícito na música reggae. O Ph. D.
Wolfgang Hans Martin Stefani, que é músico, pastor e professor especialista na
área da música sacra, traz uma interessante citação em seu livro Música Sacra, Cultura e Adoração. Stefani
define o reggae caribenho como um
ritmo secular que consiste em: “(...) uma imitação do batuque religioso
rastafári conhecido como ‘música Nyabingi’” [1].
O consumo livre
de maconha, associado à música e à busca por estados alterados de consciência, é
outro elemento característico nos círculos musicais, ensaios, camarins ou entre o público dos shows de reggae. Muitas canções fazem apologia ao uso da droga.
Na cultura reggae, o estado de inibição da razão
despertado pelo ritmo hipnótico e pelo consumo de maconha é aceito como meio de contato com o sagrado,
e como um despertamento para o conhecimento maior.
“A música reggae surgida na Jamaica, era uma
expressão mística do rastafarianismo, movimento político-religioso, também de
caráter étnico, surgido na Jamaica, que a partir de sua luta contra a ‘estrutura
escravista britânica’ reinterpretou a promessa bíblica da Terra Prometida,
localizada agora na ‘Etiópia/África’. O reggae
está profundamente ligado com substâncias alucinógenas, produtoras de ‘estados de consciência’,
que, por sua vez ‘são ao mesmo tempo fonte de conhecimentos e comunicação com o
sagrado, provocados não só pela música como pela erva, pelo contato com
elementos da natureza, pelos sonhos e pelas visões’” [2].
Ivor Myers,
ex-astro de hip-hop, nasceu na
Jamaica e é autor do livro NOVO RITMO, onde descreve sua trajetória de renúncias
à fama e à fortuna em submissão à vontade de Cristo. Sobre a religião
rastafári, Myers escreve:
“Essa religião
peculiar ensina que o ex-imperador da Etiópia, Hailé Selassié I, era a
manifestação de Deus no século 20. Surgira como um grito rebelde dos escravos
jamaicanos e cresceu para se tornar uma das forças religiosas dominantes do
mundo do hip-hop. O rastafarianismo
usa a maconha como chave para a meditação e a comunicação mais intensa com
Deus. As mechas de cabelo trançadas são o símbolo da religião. Suas raízes se
fundamentam nos ensinos de Marcus Garvey, um nacionalista jamaicano negro que
ensinava o poder dos negros e iniciou o movimento ‘De Volta à África’, no
início dos anos 1900. Marcus Garvey propagava a ideia de que um rei negro seria
coroado e se tornaria o libertador da raça negra. Muitos acharam que a profecia
se cumprira quando, em 1930, Ras Tafari foi coroado como o Imperador Hailé
Selassié I da Etiópia e proclamado como ‘Rei dos reis’, ‘Senhor dos senhores’ e
‘Conquistador Leão de Judá’, alguns de seus títulos. O movimento rastafári tira
seu nome da combinação do vocábulo Ras, que significa ‘Cabeça’, ‘Duque’ ou
‘Chefe’, com a palavra Tafari Makonnen, que é o nome de Hailé Selassié I antes
da coroação”. [3]
Em entrevista concedida
à revista High Times em 1981, o
cantor de reggae Peter Tosh fez a
seguinte declaração:
“[a]
espiritualidade e a inspiração são decorrentes da capacidade do reggae de ‘hipnotizar’ e fazer o ouvinte
‘sair de si’, isto é, a música é capaz de provocar no ouvinte o acesso a outros
‘estados de consciência’.” [4]
Nunca
experimentei maconha, apesar de estar frequentemente cercado de pessoas que
consumiam a droga. Tocar reggae era agradável, mas tornava-se monótono depois
de alguns minutos, justamente devido à repetição excessiva no ritmo conduzido
pelo baixo. É algo literalmente “hipnótico”.
Em 16 de
novembro de 2008, o jornal britânico The Guardian trazia uma matéria sobre
música e drogas, onde o autor Kevin Sampson apontava aspectos peculiares da
cultura reggae:
"Reggae era cadenciado e gentilmente
magnético, como se houvesse sido criado pela erva daninha que inspirou sua
forma e teologia. O reggae
rapidamente se tornou a trilha sonora de uma jovem Jamaica cada vez mais
politizada. Com a chegada de bandas como The Pioneers e The Wailers (com Peter
Tosh e Bob Marley), a nascente cena reggae
começou a abraçar temas sociopolíticos e religiosos e, particularmente, a
crescente influência do Rastafarianismo sobre a juventude jamaicana. O fumo de cannabis em sua forma mais pura [...]
tornou-se uma parte tão intrínseca da trindade sagrada Rasta, quanto a bandeira
etíope e o skank irregular da
guitarra base do reggae [ritmo repetitivo que acentua
acordes nos tempos fracos do compasso]. Para os Rastas, o fumo de erva ou ganja é um ato espiritual, muitas vezes,
um acompanhamento para a leitura da Bíblia, com o reggae sendo o contratempo musical para ambos, religião e modo de
vida."[5]
Podemos concluir
que as características deste gênero musical apontam para uma direção contrária
aos princípios estabelecidos por Deus em Sua Palavra para a nossa saúde e
espiritualidade. Deus espera de nós um culto racional, onde devemos orar e
cantar com a nossa inteligência.
“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas
misericórdias do nosso Deus, que apresenteis vosso corpo como sacrifício vivo,
santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.” – Rom. 12:1
“Que farei, pois? Orarei com o espírito,
mas também orarei com a mente; cantarei com o espírito, mas também cantarei com
a mente.” – I Cor.
14:15
Deus jamais orientou Seu povo no
uso de substâncias tóxicas como bebidas fortes ou drogas alucinógenas na busca
por crescimento espiritual.
O mesmo princípio se aplica à
música. Nenhum ritmo que é aceito e utilizado como meio para hipnotizar ou para
alcançar estados alterados de consciência poderá nos aproximar de Deus, mesmo
que essa mesma música apresente um texto sacro. E, infelizmente, não faltam
exemplos de arranjos de reggae na
música cristã contemporânea.
[1] Barret, The Rastafarians, p. 245; citado em: Stefani, Música Sacra, Cultura e Adoração, p. 133.
[2] Cunha, Fazendo a coisa certa: Reggae, rastas e pentecostais em Salvador, disponível em: http://musicaeadoracao.com.br/20217/a-musica-sacra-dentro-da-cosmovisao-adventista-parte-1/#_ftn9
[2] Cunha, Fazendo a coisa certa: Reggae, rastas e pentecostais em Salvador, disponível em: http://musicaeadoracao.com.br/20217/a-musica-sacra-dentro-da-cosmovisao-adventista-parte-1/#_ftn9
[4] Cunha, Fazendo a coisa certa: Reggae, rastas e pentecostais em Salvador, disponível em: http://musicaeadoracao.com.br/20217/a-musica-sacra-dentro-da-cosmovisao-adventista-parte-1/#_ftn9
[5] Disponível em: http://www.theguardian.com/society/2008/nov/16/drugs-music-link
“A meu povo ensinarão a distinguir entre o santo e o profano e o farão distinguir entre o imundo e o limpo.” – Ezequiel 44:23